segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Boa notícia: a poluição do Tietê diminuiu

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É frequente ouvir alguém se revoltar com a demora do processo de despoluição do rio Tietê. A cidade precisando de água e todo esse estoque é desperdiçado. Num país dividido entre maniqueus políticos, a discussão logo descamba para a leitura partidária: o rio escuro daqui é comparado ao petróleo de lá. A associação é automática: os bilhões investidos devem ter ido para o ralo das irregularidades, em vez de tratar esgotos.
Só que não: há uma boa notícia que não chega aos paulistanos. A poluição do Tietê diminuiu vertiginosamente desde o início da implantação do programa de despoluição, em 1993, com patrocínio da Agência de Cooperação Internacional do Japão. Nesse período, a mancha que ocupava 530km de extensão passou a apenas 70km, uma redução de 87%. Rios do interior que desaguam no Tietê estão menos poluídos e hoje é possível até pescar no Jundiaí. A melhora tem ajudado o abastecimento nesta época de carência: a Sabesp já capta água do Tietê em três locais que eram mortos há vinte anos (Salesópolis, Biritiba-Mirim e Mogi das Cruzes).
A fonte das informações não é o governo do Estado, mas a auditoria independente exigida pelo convênio com o Japão, a ONG SOS Mata Atlântica, que liderou a campanha pela despoluição do Tietê nos anos 1980/90.
Outra boa nova: a poluição despejada no rio mudou de caráter, era química e industrial quando o Tietê estava morto em 1992 e hoje é predominantemente de esgoto, que dilui em menos tempo. Isso se deve ao controle de detritos industriais, foco da primeira fase do programa (1993-2000).
O principal desafio hoje é completar a coleta e tratamento de esgoto em toda a Grande São Paulo. Embora o programa seja estadual, a adesão é uma opção municipal e nem todas as cidades aderiram. Guarulhos, segunda maior população do Estado, por exemplo, despeja praticamente todo seu esgoto, sem tratamento, no Tietê. Processada pelo Ministério Público Estadual, prometeu em um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) de 2006, tratar o esgoto até 2032. Pelos investimentos feitos desde então, com verba federal do PAC, atrasado em todo o país, é possível que a cidade não consiga cumprir nem o prazo longínquo.
Outra má notícia: a capital suspendeu a adesão ao projeto Córrego Limpo, parceria entre Estado e Prefeitura, que tem garantido avanços para a despoluição das bacias do Pinheiros e do Tietê. O programa é quase óbvio: prevê que obras municipais que tratem de canalização de córregos e rios devem ser planejadas conjuntamente para que sejam realizadas ao mesmo tempo que as estaduais, de captação e tratamento de esgotos, reduzindo custos e tempo de realização. Iniciado em meados da década passada, prevê trabalhos em 40 córregos por ano e a despoluição total de 300 cursos de água em dez anos. A suspensão, que a Prefeitura atribui a atraso burocrático, impõe atrasos e levanta um temor: no front da poluição do ar, a gestão Haddad suspendeu e depois encerrou o programa.
Apesar dos avanços, qualquer que seja sua idade, você não vai poder pescar na ponte das Bandeiras como faziam seus avós. A concentração de poluentes fixada no fundo do rio vai levar muito tempo para sumir. Mas cada ano de atraso adia também a pescaria de seu neto...
PLANTAR ÁGUA EM NOVA YORK
Se você por acaso andou preocupado com a ameaça de falta de água em São Paulo, não pode deixar de ler "O Homem Que Salvou Nova York da Falta de Água" (ed. Matrix), de Rafael Chiaravalloti. O livro narra histórias de 12 "mestres da sustentabilidade" e o que fizeram para ter esse reconhecimento.
O título se refere a Albert Appleton, responsável pelo departamento de água de Nova York a partir de 1990, quando a cidade viveu uma crise hídrica muito semelhante à que vivemos. Desde o início do século 20, a cidade tira água de um único conjunto de reservatórios na época cercados de florestas. Ao longo das décadas, a área foi ocupada, reduzindo a quantidade e a qualidade do suprimento.
Diante de todos os políticos, engenheiros e empreiteiros que diziam que a única solução era realizar obras caríssimas para captação em bacias mais distantes e para tratamento de água, ele convenceu a cidade a implantar um programa de recuperação dos mananciais já existentes.
Sob a orientação de Appleton, a prefeitura comprou áreas de florestas que estavam ameaçadas e as transformou em parques permanentes. E passou a pagar para fazendeiros replantarem a mata original que haviam cortado em suas propriedades. Com isso, não só aumentou o nível dos reservatórios como a cidade economizou bilhões em tratamento: a água chega pura às torneiras dos nova-iorquinos.
Quando começou o programa na grande cidade americana, São Paulo ainda não tinha iniciado a despoluição do Tietê. Em 2006, quando a crise lá já estava resolvida e ele era reconhecido como o homem que salvou a metrópole norte-americana da crise hídrica, Appleton esteve em São Paulo, onde deu uma palestra promovida pela Sabesp. "Parece que não aprenderam muito", diz o autor Chiaravalloti.
A julgar pelo Cantareira, não aprendemos nada: em vez de discutir a recuperação das matas em volta daqueles mananciais, só se fala de obras captação em bacias cada vez mas distantes.
Como disse em outro texto nesta coluna, só a submissão das políticas públicas do Brasil aos interesses dos grandes empreiteiros pode explicar o fascínio pelas soluções caras e insustentáveis, quando tantas providências baratas poderiam resolver nossos problemas. 
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/leaoserva/2015/08/1663580-boa-noticia-a-poluicao-do-tiete-diminuiu.shtml

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